A Assemae apresenta o terceiro artigo da série de textos em defesa da gestão pública do saneamento, dessa vez com a abordagem do sociólogo Edson Aparecido da Silva, que destaca a ameaça da privatização para a inclusão social. Confira o texto abaixo:
Enfrentar a privatização para universalizar o saneamento
O país enfrenta uma grande investida do atual governo contra todos os serviços de infraestrutura passíveis de privatização. É a retomada do projeto neoliberal que dominou o Brasil nos anos 1990 e foi responsável pela dilapidação de boa parte do patrimônio público, que na maioria das vezes foi vendido a preços muito menores do que seus reais valores.
As atuais medidas apresentadas como panaceia para resolver os problemas de infraestrutura no país têm como objetivo central colocar o Estado como coadjuvante no enfrentamento dos desafios da promoção plena das políticas públicas que envolvem o setor de transporte, moradia, energia, saneamento, entre outros, e que tratam diretamente das condições de vida das pessoas, portanto, do desenvolvimento social e econômico do Brasil.
O atual governo não medirá esforços para colocar em prática seu plano privatista e uma das iniciativas será destacar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como financiador e/ou modelador dos processos de privatização, ou seja, transformará uma instituição, que tem o papel de agente do desenvolvimento social e econômico, a serviço do setor privado e daqueles estados e municípios que pretenderem conceder seus serviços. O mesmo caminho deverá seguir a Caixa Econômica Federal (CEF) e outros agentes financeiros como o Banco do Brasil.
A última ação do governo foi a edição da Medida Provisória (MP) 727 que criou o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). Aprovada pelo Senado no dia 08 de setembro de 2016, seu principal objetivo foi o de ampliar e fortalecer a relação do Estado com a iniciativa privada por meio da celebração de contratos de parceria para a execução de empreendimentos públicos de infraestrutura e de outras medidas de desestatização.
No caso do saneamento básico essas iniciativas significam o fim de um processo que vinha se desenvolvendo e se consolidando desde 2003 como, por exemplo, o fim de um longo período de contingenciamento de recursos públicos para o setor e logo depois a instituição do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) 1 e 2, que injetaram soma significativa de recursos no setor. Destaque também para a criação do Ministério das Cidades, antiga reivindicação dos movimentos pela reforma urbana; a realização das conferências nacionais das cidades; o estabelecimento dos comitês técnicos de saneamento; mobilidade e habitação e a formulação do Plano Nacional de Saneamento (Plansab), enfim, a concretização de um amplo processo de participação e controle social.
Estão na mira da privatização, por meio do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE) do Rio de Janeiro; a Companhia de Saneamento do Pará (COSANPA), a Empresa Baiana de Águas e Saneamento S.A (EMBASA); a Companhia Espírito Santense de Saneamento (CESAN) e a Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia (CAERD). Vale destacar que o Aquífero Guarani uma das maiores reservas de água doce do país, também tem sido colocado na agenda das privatizações, sobretudo, dos grandes grupos econômicos.
Por outro lado, as experiências de concessão privada têm demonstrado que as áreas mais pobres não são de interesse do setor privado, que prefere as regiões metropolitanas, as grandes cidades e as áreas onde houve investimentos públicos recentes, portanto, onde há retorno garantido.
Privatizar o saneamento é ir na contramão do que tem acontecido em várias cidades pelo mundo, com destaque para Paris, berço do setor privado na área de saneamento, que no ano de 2010 remunicipalizou os serviços e, como consequência imediata, houve uma ampliação dos investimentos e redução de tarifa.
A Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental acredita que o principal desafio para a universalização do acesso aos serviços de saneamento básico no Brasil passa, necessariamente, pelo enfrentamento dessas propostas de privatização que vêm ganhando força no último período.
Lutar para garantir saneamento básico para todos e todas, com qualidade e modicidade tarifária, sobretudo, a ampliação da coleta e tratamento dos esgotos e a despoluição dos corpos d’água, é tarefa urgente. Para isso é necessária uma ampla articulação dos vários seguimentos da sociedade civil, como sindicatos, movimentos sociais e populares, gestores, igreja, entre outros. Dessa forma vamos garantir que não haja retrocesso nas políticas de saneamento conquistadas até aqui.
Por: Edson Aparecido da Silva – Sociólogo, membro da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental, assessor de saneamento da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e membro do Coletivo de Luta pela Água (SP).
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