“Não é possível que a gente faça saneamento desrespeitando a Constituição”. É o que afirmou o secretário executivo da Assemae e advogado, Francisco Lopes, durante evento online que debateu os impactos da nova Lei 14.026/20, cujo teor altera a política federal de saneamento básico no Brasil. O webinar ocorreu na quinta-feira, 12 de novembro, sob a iniciativa do Comitê da Bacia Hidrográfica do rio Paranaíba.
Na ocasião, o advogado destacou os aspectos inconstitucionais da Lei 14.026/20, que coloca em risco a autonomia e titularidade dos municípios, apresentando conceitos contraditórios sobre a definição do que seria interesse local e comum, além do compartilhamento de instalações operacionais entre sistemas de saneamento.
O texto também obriga a criação de unidades regionais, proíbe a celebração de contratos de programa entre agentes públicos, e permite a possibilidade do exercício da titularidade por meio de consórcio, o que é claramente inconstitucional, já que a União não tem competência legal para fazer essas alterações via lei ordinária.
Segundo Francisco Lopes, a Lei 14.026/20 representa o abuso de poder econômico por parte da União, impondo aos municípios uma única forma para a delegação dos serviços de saneamento básico, isto é, a concessão. “Não é verdade que a iniciativa privada não participa do saneamento. A Lei das Concessões é de 1955, a Lei das PPPs é de 2004. Então, a gente não precisa passar por cima da Constituição e dos municípios para ter saneamento universalizado no Brasil”, destacou.
De acordo com o secretário executivo, a Lei 14.026/20 desmonta a estrutura pública do saneamento para beneficiar, principalmente, o setor privado, o que ameaça todo o trabalho dos serviços municipais de saneamento, inclusive daqueles com sistemas universalizados. “Mesmo com vários exemplos de remunicipalização no Brasil e no mundo, a Lei não trouxe nenhum incentivo ou mecanismo que viabilize a gestão pública. E nós sabemos que a remunicipalização dos serviços de saneamento, como na cidade de Itu, aconteceu porque o setor privado não deu conta e a gestão pública teve que assumir”, alertou.
Foi com base nesses argumentos que a Assemae ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6583, na qual solicita a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 2º, 3º, 5º, 7º, 9º, 11, 13 e 15, entre outros, por arrastamento, da Lei 14.026/2020.
O pedido da Assemae se justifica porque a nova legislação desrespeita diretamente a Constituição Federal brasileira, com destaque para a extrapolação de competência da União, esvaziamento de competência municipal, abuso de poder econômico, intervenção federal sobre a autonomia municipal e violação ao pacto federativo.
A ADI 6583 já recebeu a manifestação formal de apoio, via pedido de amicus curiae, por parte da Federação Nacional de Urbanitários (FNU) e do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgoto do Estado do Rio Grande do Sul (Sindágua/RS). O pedido de amicus curiae evidencia o protagonismo da Assemae no assunto e endossa o apoio das entidades na luta contra a declaração de inconstitucionalidade da Lei 14.026/20.