Acesso à água: direito fundamental
No Dia Mundial da Água, 22 de março, creio ser pertinente algumas reflexões sobre o tema. Começo pela obrigação do Governo brasileiro de reconhecer os direitos humanos à água e ao saneamento, por ser país membro da ONU – Organização das Nações Unidas. A grosso modo, são três princípios básicos determinados pela entidade internacional e que devem ser cumpridas pelos seus integrantes: a obrigação de respeitar (toda e qualquer ação que interfira nos direitos a água e ao saneamento devem ser evitadas); a obrigação de proteger (o governo é obrigado a evitar que terceiros, com interesses diversos, interfiram no direito à água); e, finalmente; o governo tem a obrigação de executar (ou seja, deve tomar medidas para que acesso à água seja garantido).
Teoricamente, as obrigações citadas seriam naturais para qualquer Estado, pois trata-se de um direito que garante a vida humana e a dignidade. Mas se olharmos para a Índia, por exemplo, a realidade é diferente, pois lá a privatização da água caminha a passos largos, com o incentivo de instituições financeiras internacionais. Os movimentos sociais, por sua vez, lutam contra o descumprimento do compromisso assumido pela Índia de promover o direito à água, o que é previsto na constituição indiana.
No nosso país há uma grande pressão empurrando os serviços públicos de abastecimento para a privatização. Mas essa não seria uma forma de tirar do Governo a responsabilidade de garantir o direito à água? Não existe clareza sobre os reais efeitos da privatização da água, mas exemplos negativos são inúmeros. Por outro lado, se o serviço público tem falhas, por que não investir na qualificação da gestão, mantendo a titularidade pública?
Um dos riscos da privatização da água é o efeito devastador para aqueles que não podem pagar pelo serviço. A lógica é simples: as empresas privadas precisam ter uma margem de lucro, e para tanto, reduzem a força de trabalho, deixam de oferecer serviços e aumentam as taxas cobradas dos consumidores. Em um país com a economia estremecida, como o Brasil, com alto índice de desemprego, os recursos hídricos transformados em mercadoria só podem ter um resultado: abastecimento negado a quem não pode pagar caro pela água. Tal quadro foi constatado em vários municípios europeus e norte-americanos.
Não podemos deixar de citar aqui uma tendência mundial de remunicipalização de serviços de abastecimento de água, a exemplo de cidades situadas nos Estados Unidos da América, Alemanha, França, dentre outros. Ou seja, a privatização não funcionou em várias localidades, provando que essa medida não é a única alternativa para o setor, com grandes possibilidades de não dar certo.
Outra forma velada de transformar a água em mercadoria é a concessão de fontes e aquíferos para grandes empresas que vendem água engarrafada. Sem esquecer das montanhas de lixo que são o resultado da venda das garrafinhas em cada esquina. Então é um duplo prejuízo: a privatização da água e o dano ambiental causado pelo plástico espalhado pelas ruas e sobrecarregando os aterros sanitários. A única certeza é que o lucro das gigantes da água continua crescendo vertiginosamente.
Não podemos esquecer dos grandes usuários de água, que são principalmente as indústrias, as agriculturas, mineração, petróleo, gás e papel. Classifico como errônea e/ou insuficientes as campanhas de economia de água direcionadas apenas aos consumidores residenciais, pois os grandes consumidores gastam uma quantidade infinitamente maior de água mas não são pressionados a reduzir o gasto do recurso hídrico. O que acaba tendo um efeito devastador no meio ambiente.
Além de prezar pela titularidade pública e pela gestão de qualidade dos serviços municipais de água e esgoto, a Assemae – Associação Nacional dos Serviços Municipais de Água e Esgoto atua em favor da qualidade de vida de cada cidadão brasileiro. Para tanto, a entidade atua em diversas frentes, levando a voz dos seus associados às instâncias decisórias, defendendo os interesses dos municípios e o direito à água de qualidade.
Aparecido Hojaij
Presidente da Assemae